domingo, 11 de janeiro de 2009

O IPI e o lucro das montadoras

A crise financeira mundial, que se iniciou no setor imobiliário (especulativo) norte-americano, rapidamente começa a contaminar a dita “economia real”. Recentemente as montadoras norte-americanas Ford, General Motors e Chrysler anunciaram que podem falir se não receberem um pacote de ajuda do governo, estimado em cerca de US$ 15 bilhões. A ameaça, como sempre, é o desemprego, colocando na rua milhares de trabalhadores destas indústrias. Outra gigante do ramo, a japonesa Toyota, anunciou o primeiro prejuízo de seus 70 anos de história neste ano de 2008, com uma perda de cerca de US$ 1,7 bilhão e também manda as favas o discurso de livre mercado, solicitando apoio do governo japonês.
No Brasil, a situação destas montadoras não é diferente, pois seus pátios estão lotados de automóveis, tanto aqueles destinados para o mercado interno como os voltados a exportação. E como os governos das economias centrais não estão dispostos a salvar estas empresas sozinhas, elas já ameaçam com fechamentos e demissões aqui em nosso país. Esquecem que boa parte do parque produtivo destas empresas foi inteiramente financiado com recursos públicos dos brasileiros, doados tanto pelos militares como mais recentemente na era FHC.


O governo Lula, fazendo jus aos elogios internacionais de grande estadista, capaz de conter a crise no Brasil, decretou no dia 11/12/2008 uma redução média do Impostos sobre Produção Industrial (IPI) de 7% nos carros populares (poder-se-ia lembrar que carro popular no Brasil é mito). O objetivo, como sempre, é nobre, pois esta redução estimularia o consumo, combatendo a recessão e o desemprego. E é uma decisão coerente, afinal, apesar do governo Lula não ser nenhum desenvolvimentista, esta muito mais próximo de medidas keynesianas do que o governo Bush, por exemplo, que após o estouro da crise se tornou uma espécie de neo-keynesiano.
Mas quem de fato ganha com esta redução do IPI? A economia brasileira? Os trabalhadores brasileiros? Os consumidores? Será que a redução dos preços finais dos automóveis chegará a 7%? Será que não haverá desemprego no setor automobilístico? Será que as montadoras, como GM, Ford e Toyota, entre outras, vão reinvestirem na economia brasileira seus lucros, obtidos com as vendas graças ao IPI reduzido?
Estas perguntas podem até ser respondidas positivamente, o que é pouco provável. Mas ainda assim, a medida do governo Lula não ficaria isenta de criticas, pelo menos se o objetivo da gestão de nossa economia for o desenvolvimento do país. Pois uma redução desta magnitude produzirá efeitos positivos primeiramente sobre o consumo de automóveis, o que agravará problemas de centros urbanos, como São Paulo, onde milhares de novos veículos chegam às ruas todos os dias. Fora os problemas de congestionar o tráfego (o que reduz a mobilidade de mercadorias e da economia como um todo), acarretando agravamento de problemas ambientais, devido à poluição causada por este tipo de veículos.
Deve-se perguntar, por outro lado, se do ponto de vista da geração de trabalho e renda, este modelo de investimento, que concentra recursos em indústrias de grande porte, que concentram suas atividades no sul e sudeste brasileiro, contribui efetivamente para o desenvolvimento do país, ou apenas contribui para elevar a diferenciação regional e desigualdade social no Brasil.
É correto sim o governo estimular setores econômicos, porém este estímulo deve dialogar com as necessidades do conjunto do país e da sua classe trabalhadora. O fomento ao mercado interno, via produção de alimentos e bens duráveis para a agricultura, por exemplo, poderia contribuir não só na segurança alimentar de nosso povo, mas também no crescimento e desenvolvimento como um todo, aproveitando-se inclusive do parque fabril que possuímos.
O mesmo pode-se dizer de um estímulo adequado à habitação popular, pois embora a indústria de construção civil esteja comemorando seus lucros neste final de 2008, é resultado muito mais da reversão de capital especulativo em patrimônio permanente, ou seja, não são os trabalhadores que estão massivamente adquirindo casas, mas especuladores assegurando seus lucros futuros. Porém, financiamentos massivos e imediatos para casas populares, certamente trariam resultados melhores para os trabalhadores, do que os recursos subsidiados as montadoras.
Estes são apenas alguns aspectos, mas como nosso presidente quer apenas que não nos preocupemos e que vamos às compras, vamos esquecer que mais uma vez estamos direta e indiretamente, assegurando os lucros das montadoras e dos especuladores internacionais, com os impostos que pagamos para serem presenteados aos “pobres” acionistas destas transnacionais.

Fabio Moraes Lemes[1]


[1] Economista, Mestrando em Desenvolvimento pela Unijuí, Técnico de Incubação de Empreedimentos de Economia Solidária.

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quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Crise, depressão ou medo?

Nos últimos meses estamos acompanhando o desenrolar do que tem sido chamado de “crise do sistema financeiro mundial”. Muitas vezes comparada com a grande depressão de 1929 e considerada por muitos analistas como sendo a maior crise econômica da história do capitalismo. Mas o que é esta crise? Porque é uma crise do sistema financeiro?
A crise começou com o problema das hipotecas imobiliárias, ou seja, o bancos norte-americanos emprestaram muito dinheiro a credores com capacidade de pagamento duvidosa, os chamados sub-prime, e estes em troca hipotecavam suas casas e até compravam novas casas com o dinheiro dos empréstimos, visando obter lucro pela valorização destes imóveis. A partir do momento em que o mercado ficou saturado, os valores dos imóveis reduziram-se drasticamente, de forma que a dívida tornou-se muito superior ao valor do bem adquirido ou dado em garantia na forma de hipoteca. Assim ficou mais fácil entregar a casa hipotecada do que pagar a hipoteca. Os bancos, por sua vez, para garantirem o seu investimento contrataram seguros para estes papéis de hipoteca, as seguradoras fizeram seguro deste seguro e resseguro do seguro e resseguro do resseguro... em uma extensa rede de relações financeiras baseada em papéis de alta rentabilidade e de altíssimo risco. Quando uma elevação na taxa básica de juros dos EUA alterou os cálculos de viabilidade destes negócios, os devedores optaram por deixar de pagar suas hipotecas, tornaram-se inadimplentes e devolveram seus imóveis esse sistema inteiro implodiu e o resultado todos nós vimos.
Além de perguntar sobre as causas que originaram esta crise também é preciso refletir sobre as suas conseqüências, os impactos que ela produziu pelo mundo e especialmente no Brasil. A credibilidade do sistema financeiro mundial foi afetada profundamente pois, além de provocar prejuízos financeiros por toda parte, a crise provocou a quebra de inúmeras empresas, inclusive bancos de grande porte, e seus efeitos só estão sendo contidos graças as ações coordenadas dos governos dos países ricos e com a destinação de US$ trilhões de recursos públicos para salvar outras.
Os governantes brasileiros têm afirmado que o Brasil está seguro, que possui reservas de segurança e que não será afetado mais seriamente pela crise.
Efetivamente o nosso sistema financeiro passou por um período de ajustes, após a crise de 1998/99, tornando-se um sistema bem mais seguro, estável e responsável. De outro lado, uma política econômica conservadora que prioriza o controle da inflação antes do crescimento econômico, especialmente através manutenção de uma taxa de juros muito alta. Toda a vez que a inflação dá sinais de crescimento os juros aumentam, fato que causa um impacto direto no consumo e no investimento. Quanto ao consumo fica mais difícil comprar, especialmente a prazo. Quanto ao investimento, responsável pelo aumento da capacidade produtiva instalada, o resultado é ainda pior, torna-se muito mais difícil e mais caro investir, o custo de oportunidade é maior quanto maior for a taxa de juros.
Os impactos que o Brasil está sofrendo, resultantes da crise internacional, resultam muito mais do medo em relação ao que poderá acontecer do que dos problemas reais do sistema financeiro e da economia brasileira em si. Pelo medo de consumir, pelo medo de investir, pelo medo da crise. Sim, no Brasil a crise é uma crise gerada pelo medo e não pela fragilidade econômica, este medo é agravado pelo aumento ou pela não diminuição das taxas de juros, que num prazo maior acabam impedindo o crescimento do país.
Claro que muitas empresas multinacionais instaladas no país devem sim sofrer com a perda de faturamento e mesmo a falência de suas matrizes e filiais espalhadas pelo mundo, bem como muitas empresas nacionais que fizeram negócios de longo prazo com um alto grau de risco ou perderam dinheiro com as mudanças do câmbio e a retração do mercado mundial. Esta retração do mercado deve impactar negativamente nas exportações, mas é preciso lembrar que temos um mercado interno com grande potencial, de forma que os produtos que seriam exportados podem ser consumidos internamente. Além disso, os ajustes no câmbio podem compensar os preços.
Além disso, temos as reservas, que são para momentos de dificuldade. Bom se o mercado mundial está em dificuldade e a economia local necessita de investimentos, esta na hora de usarmos estas reservas para fazer investimentos e apoiar as exportações. O investimento é capaz de gerar novos empregos, mais renda e crescimento econômico, portanto esta é a hora de incentivar investimentos, tanto estatais quanto privados, especialmente pela redução da taxa de juros e pela disponibilização de recursos.
Portanto, como o nosso presidente recomenda otimismo e pede para a população consumir mais, seria importante que o governo pudesse articular todos os seus instrumentos de política econômica neste sentido. É importante manter os programas e projetos de investimento, os programas sociais de distribuição de renda e aumento do poder de compra da população, mas também as linhas de crédito para investimentos privados e, especialmente, reduza os juros.

Diogo Moacir Mattana[1]
[1] Acadêmico do curso de Economia, bolsista PIBEX e integrante do grupo PET.

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